1 Desde o alvorecer da humanidade, a capacidade de criar e transformar o mundo ao nosso redor tem sido uma característica fundamental da espécie humana. Quando um relâmpago incendiou uma árvore, o homem aprendeu a domesticar o fogo, uma descoberta que não só trouxe calor e luz, mas também revolucionou a maneira como cozinhamos e nos protegemos. Quando observou troncos rolando por colinas, ele teve a genialidade de criar a roda, que deu início a uma era de mobilidade e comércio sem precedentes. E, ao sentir a força do vento, concebeu a vela, que permitiu à humanidade navegar pelos mares e explorar o desconhecido.
2 Essas histórias de descoberta e invenção são, de fato, fenomenais. Elas ilustram a engenhosidade do homem, a capacidade de observar, experimentar e aplicar os fenômenos naturais de forma que transcendam a simples sobrevivência, impulsionando o progresso civilizacional. Cada uma dessas criações marcou um avanço significativo na história humana, transformando radicalmente nossa existência e moldando o mundo como o conhecemos.
3 No entanto, junto com essas conquistas brilhantes, há uma sombra que paira sobre a história da humanidade. A mesma mente que aprendeu a domar o fogo e a mover-se sobre rodas também desenvolveu maneiras de subjugar, humilhar e atormentar seus semelhantes. E então, surge a pergunta inevitável: quem ensinou o homem a ser cruel?
4 A resposta não é simples, pois reside no coração da condição humana. Diferente das criações materiais, como o fogo ou a roda, a crueldade não é algo que pode ser atribuído a uma descoberta ou invenção específica. Não é algo que foi "ensinado" da mesma maneira que se ensina uma habilidade prática. Em vez disso, a capacidade de infligir dor e sofrimento parece emergir das profundezas do próprio ser humano, da complexidade de nossas emoções, desejos e medos.
5 A história da humanidade está repleta de exemplos de opressão e violência, desde guerras tribais até genocídios em massa, desde a escravidão até a exploração econômica e social. Essas ações frequentemente decorrem de uma combinação de fatores: a busca pelo poder, o medo do outro, a necessidade de controle, o desejo de riqueza e a crença na superioridade de um grupo sobre outro. O homem, ao longo da história, tem frequentemente justificado suas ações cruéis com base em ideologias, religiões e até em interpretações distorcidas da ciência.
6 É possível argumentar que a capacidade de criar e a capacidade de destruir são dois lados da mesma moeda. A mesma criatividade que leva à invenção de uma roda pode ser canalizada para a criação de armas de guerra. A mesma inteligência que permite a construção de sociedades complexas também pode ser usada para desenvolver sistemas de opressão e controle. A capacidade humana de imaginar e conceber o impossível, que é a fonte de tantas maravilhas, também pode ser pervertida para causar sofrimento.
7 Isso não quer dizer que a crueldade seja inevitável ou inata ao ser humano. Muitos filósofos, como Rousseau, acreditavam que o homem nasce bom, mas é corrompido pela sociedade. Outros, como Hobbes, viam o homem como naturalmente competitivo e egoísta, necessitando de estruturas sociais rígidas para conter sua natureza. Independentemente da visão que se adote, o fato é que a história humana é uma dança constante entre a luz e a sombra, entre o progresso e a destruição, entre a compaixão e a crueldade.
8 O que podemos aprender com essa dualidade? Talvez a maior lição seja a necessidade de consciência e responsabilidade. Assim como o fogo pode tanto aquecer quanto destruir, nossas capacidades devem ser guiadas por princípios éticos que promovam o bem-estar e a dignidade de todos. A criação e a destruição são parte de nossa natureza, mas cabe a nós escolher como usaremos nosso poder.
9 No final, a pergunta sobre quem ensinou o homem a ser cruel pode não ter uma resposta simples ou única. No entanto, a escolha de agir com compaixão, justiça e humanidade está sempre ao nosso alcance. Se o homem é capaz de criar maravilhas a partir dos fenômenos naturais, ele também é capaz de criar uma sociedade mais justa e equitativa, onde a crueldade seja vista não como uma inevitabilidade, mas como uma aberração que pode e deve ser superada.
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